terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Resenha-resumo Livro O que é Linguística? - Eni Puccinelli Orlandi


Capítulo 1 – 8

Capítulo 1 – Saber e poder
Sendo a linguagem algo natural para o ser humano se comunicar no meio onde vive, o homem buscava desde a antiguidade explicá-la, passando pela Grécia antiga, antigos hindus, Idade Média, etc. Cada qual trazia questões a respeito da organização da linguagem, por qual critério uma palavra era atribuída a algo, estudos linguísticos por motivos religiosos e até mesmo a procura por uma teoria geral da linguagem. Portanto, a linguística se tornou uma ciência com o objetivo de explicar a linguagem verbal humana.

Capítulo 2  –O que é e o que não é linguística
A linguística não lida com regras ou normas, pois trabalha com a linguagem, especificamente a linguagem: verbal, oral e escrita. Os signos possuem papel importante na cultura e identidade social dos homens, pois abrangem os sinais da fala e da escrita produzidos pelo homem, pois abrangem os sinais da fala e da escrita produzidos pelo homem, podendo estes ser verbais (formados por palavras) ou não-verbais (imagens, sons). Os pensadores do século XVII (gramáticas gerais) procuraram definir a linguagem e a gramática de forma racional, com princípios lógicos e gerais que deveriam reger todas as línguas, funcionando como uma representação do pensamento de forma clara e precisa, a criação de uma língua universal. Já os pensadores do século XIX (gramáticas comparativas) observaram que a língua se transforma com o passar do tempo, de forma independente e regular. Perceberam semelhanças gramaticais e sonoras entre as línguas quando comparadas, desvalidando assim o ideal de língua universal e iniciando a busca pela língua de origem.

Capítulo 3 –Duas obras, um Saussure e nenhuma publicação
Apesar de Saussure ser conhecido pelo Curso da Linguística Geral, em que baseia-se a linguística moderna, essa não foi a tarefa com que mais se dedicou. Saussure procurou analisar Anagramas, mostrando a existência de um texto sob o texto poético, um tipo de linguagem sob a linguagem, porém não obteve grande reconhecimento. Para ele, a linguística teria como objeto a língua, e define a mesma como um ‘’sistema de signos’’, esses signos seriam uma associação do significante para o significado, onde o significante seria a imagem acústica e o significado seria o conceito em si. Saussure também distingue a fala da língua, excluindo a fala da linguística por se tratar de algo individual, e a separação da sincronia da diacronia. Para Saussure, a estruturação da língua se da pela junção de unidades linguísticas que só possuem valor se relacionadas ao todo. Dentro do estruturalismo, há também o funcionalismo, que tem por objetivo analisar as funções desempenhadas pelas unidades linguísticas nos aspectos tanto fônicos, gramaticais e semânticos.

Capítulo 4 –As muitas funções
As funções constitutivas da linguagem se caracterizam pelo papel que os elementos desempenham no esquema da comunicação, possuindo assim as funções: expressiva; conativa; referencial; fática; poética e metalinguística. Há também a forma de funcionalismo que considera os desvios da linguagem como algo funcional, discordando que os erros devem ser descartados, mas sim aproveitados para estudo. Os círculos eram grupos constituídos de jovens estudiosos que se reuniam para discutir a linguagem e foram substanciais para o desenvolvimento da linguística.

Capítulo 5 –Chomsky: Uma teoria científica explicativa
Noam Chomsky propõe uma teoria chamada gramática com estudo centrado na sintaxe e a finalidade de dar conta das frases que pertencem à língua sem atribuir normas, em que esta constituiria um nível autônomo, surgindo assim a gramática gerativa, que seria a possibilidade de gerar frases em quantidades infinitas por um número limitado de regras, tornando assim a linguística explicativa e científica. Para Chomsky, o linguista tem como dever descrever a competência do falante, esta definida como a capacidade que o falante/ouvinte tem de produzir/compreender qualquer frase da língua e o conhecimento a respeito das frases. Os falantes podem formar frases novas com vase em regras predeterminadas e a tarefa dos linguistas é justamente mostrar essa capacidade. A espécie humana possui aptidão inata para a linguagem, faz parte de sua natureza.

Capítulo 6 –O social e o cultural
A fala em si varia por diversos fatores, sendo eles sociais ou culturais, e suas características se distinguem, por exemplo, pelo idioleto, dialeto, língua nacional e a mistura de línguas. É encontrada certa dificuldade em definir de que natureza se trata a relação entre a linguagem e a sociedade, pois essas diferem em dois aspectos: a de causa e efeito. A sociolinguística trata-se de um ramo da linguística que observa e analisa dados. Ela considera a sociedade como causa, portanto a linguagem seria de tal forma devido as estruturas sociais, levando em conta o falante real, isto é, a relação das variantes linguísticas com as variantes sociológicas, e que a língua é um sistema diversificado e em constante mudança. Já a etnolinguística considera a linguagem como uma causa, assim as diferenças culturais e sociais estariam sendo fundadas pela linguagem. Haveria ainda uma terceira possibilidade definida pela sociologia da linguagem, em que o fator social e o fator linguístico estariam unidos, e a língua não seria apenas um meio de transmitir informações. A pragmática trabalhava com a importância da significação, de que forma o signo era entendido pelo usuário. A teoria da enunciação trata da subjetividade da linguagem, e a sua função na composição da identidade do sujeito, o modo pelo qual o mesmo usa de artifícios da linguagem para evidenciar-se naquilo que diz.

Capítulo 7 –A análise de discurso: mais uma volta nos círculos
A análise do discurso propõe uma teoria crítica da produção da linguagem pela análise do texto, buscando expor seu funcionamento e sua ligação com as formações ideológicas. Para ela, a linguagem seria formada pelo sujeito, pois ao analisar um texto o mesmo atribuiria um significado individual, levando em conta sua dimensão ideológica.

Capítulo 8 –Tecnologias da linguagem: um novo funcionamento

A linguagem digital traz novas formas de informação, comunicação e interpretação por possuir diferentes maneiras  de significar, isto é, novas formas de textos, além de expandir e diversificar os meios transformando a relação do indivíduo com a leitura e a escrita, fazendo com que o mesmo compreenda a linguagem de outras maneiras. Os linguistas admitem que as tecnologias da linguagem se dão por uma necessidade histórica, social e científica, e que a mesma colabora para o desenvolvimento da relação do indivíduo com a linguagem.

Análise do conto ‘’A incrível e triste história de Cândida Erêndira e sua avó desalmada’'


1. Estrutura 

Trama e enredo 
  Erêndira e a avó viviam na enorme mansão situada no deserto quando o vento forte deu suas primeiras investidas, trazendo o vento de sua desgraça. Exausta pelo excessivo e abusivo serviço doméstico realizado para a avó, Erêndira coloca o candelabro aceso em cima da cabeceira e adormece. Ao acordar, sua desgraça estava concretizada. O vento havia derrubado seu candelabro em cima das cortinas e as chamas tomaram conta da mansão. Decidida a recuperar o que perdeu, a avó impõe a Erêndira uma dívida, dando início a toda sua crueldade. A avó decide prostituir a neta e, conforme Erêndira fica conhecida no ramo, consegue alguns ganhos. Entre seus clientes, Erêndira acaba apaixonando-se por Ulisses, sentimento mútuo que o leva a tentar tirá-la das garras da avó. Conforme a tentativa falha e ambos são pegos durante a fuga, Erêndira e a avó seguem sua viagem em direção a outras terras, deixando Ulisses para trás. Atormentado pelas lembranças de Erêndira, Ulisses parte em sua busca, porém, ao encontra-la, Erêndira lhe propõe que mate a avó. Cego por amor, Ulisses enfim a mata, contudo, Erêndira pega o colete de ouro da avó e foge, sem rumo, deixando Ulisses e seu passado para trás.

As personagens e suas classificações

Personagens principais 

A avó desalmada: Ex-prostituta, resgatada por Amadis pai, seu falecido marido, é uma mulher cruel e abusiva, nostálgica, gorda e branca como uma baleia, possui sonhos de grandeza aos quais submetia Erêndira a serviços domésticos excessivos e caprichos da avó desde pequena. Ao longo da narrativa demonstra ser uma pessoa fria e sem coração, pois prostitui a própria neta levando-a a exaustão, sem preocupar-se com o bem estar da mesma, características visíveis desde o início da história, portanto pode-se classificar como uma personagem plana.

Cândida Erêndira: Filha de Amadis filho, 14 anos, menina tenra e lânguida, e que apesar dos abusos cometidos pela avó demonstrou-se ser calma e mansa, sem se rebelar. Conforme a narrativa avança, Erêndira demonstra ter rancor pela avó, tentando escapar e no fim até mesmo matá-la, deixando a cargo de Ulisses o ato. Porém, seu desejo maior era de ser livre, surpreendendo o leito ao final da história, o que a caracteriza como uma personagem plana com tendência a redonda.

Ulisses: Jovem bonito, com aspecto de anjo, apaixona-se cegamente por Erêndira, sentimento do qual a mesma parece corresponder no início. Esse amor o leva a cometer atos inesperados, mudando seu destino e o de Erêndira. Trata-se de um personagem plano.

Personagens secundários 
São todas personagens planas os seguintes:

O fotógrafo: Acompanha de bicicleta Erêndira e sua avó. Ao ver Erêndira fugir, prefere fingir-se de desentendido e parte, porém após a fuga a avó descobre a falcatrua e acaba por encontrar o fotógrafo no caminho, onde o mesmo é abatido pelos agentes da estribo.

 Lojista da povoação: Homem repugnante, viúvo e conhecido por pagar uma boa quantia pela virgindade. O mesmo compra Erêndira por um preço baixo devido a sua análise na garota, e a abusa de forma brutal.

Os Amadises: Amadis pai, do qual a avó desalmada é viúva, é morto em combate, e Amadis filho, pai de Erêndira, é morto por febres melancólicas.
O homem do correio: Homem ao qual a avó deixou que pagasse menos para possuir Erêndira, com a condição de que este fizesse propaganda da mesma.

 Os missionários: Detém a custódia de Erêndira por um tempo, a livrando do abuso da avó, porém impondo à menina trabalhos pesados.
O carregador: Pretende levar Erêndira embora, porém desiste quando a avó lhe conta o preço da menina, baseado na divida que a mesma tem após acidentalmente incendiar a enorme mansão.

As prostitutas: Por inveja, carregaram Erêndira nua e acorrentada a cama até o centro da praça, expondo-a.

Foco narrativo 
O narrador do conto usa a terceira pessoa para narrar, sendo heterodiegético, pois não participa da história. O foco narrativo fica como narrador onisciente neutro, já que em nenhum momento o narrador faz comentários opinativos sobre as personagens ou situações. O narrador é observador e a narração acaba por ser distanciada. Não aproxima o leitor de nenhuma situação ou pensamento dos personagens.

Tema, motivos e motivação 
O tema do conto é a prostituição. Os motivos são: a maldade, a crueldade, exploração infantil, o rancor, o ódio e a paixão. A motivação da maldade, crueldade e da exploração infantil originam-se da avó em razão de suas ambições. Já a motivação do rancor e do ódio partem de Erêndira que, ao ser prostituída pela avó, cria ódio pela mesma e a deseja ver morta. A motivação da paixão é o sentimento de Erêndira por Ulisses.

Nó, clímax e desfecho
O nó ocorre quando Erêndira deixa o candelabro aceso perto das cortinas, causando o incêndio na mansão. O clímax ocorre na tentativa de Erêndira de esfaquear a avó. Já o Desfecho seria a fuga de Erêndira após Ulisses matar a avó desalmada.

Espaço, ambiente e ambientação 
Praticamente toda a história se desenvolve no deserto, mudando apenas quando estão em frente ao mar. O narrador usa as ações dos personagens como recursos de ambientação, como no trecho abaixo, no qual as ações brutais e cruéis do viúvo constroem um ambiente violento:

‘’Á primeira tentativa do viúvo, Erêndira gritou algo inaudível e tentou escapar. O viúvo respondeu-lhe sem voz, torceu-lhe o braço pelo punho e arrastou-a até à rede. Ela resistiu-lhe com um arranhão na cara e voltou a gritar em silêncio e ele respondeu-lhe com uma bofetada soleque que a levantou do chão e a fez flutuar um instante no ar com o comprido cabelo de medusa ondulando no vácuo, abraçou-a pela cintura antes que voltasse a pisar no chão, derrubou-a dentro da rede com um golpe brutal e imobilizou-a com os joelhos. Erêndira sucumbiu então ao terror (...)’’ (página 53).

O narrador também usa a decoração dos locais como recursos de ambientação

''Enquanto a avó navegava pelos lamaçais do passado, Erêndira ocupou-se a varrer a casa, que era escura e pintada de várias cores, com móveis frenéticos e estátuas de césares inventados, e aranhas de lágrimas e anjos de alabastro, e um piano com verniz de ouro, e numerosos relógios de formas e medidas imprevisíveis. Tinha no pátio uma cisterna para armazenar durante muitos anos a água transportada a dorso de índio desde mananciais remotos, e numa argola da cisterna estava uma avestruz raquítica, o único animal de penas que pôde sobreviver ao tormento daquele clima malvado. Estava longe de tudo, na alma do deserto, junto a uma espécie de povoado com ruas miseráveis e ardentes, onde os cabritos se suicidavam de desolação quando soprava o vento da desgraça’’ (página 49-50).

No trecho abaixo, além de usar a decoração, também ressalta que ‘’ouviam-se gritos distantes, uivos de animais remotos, vozes de naufrágio’’, demonstrando o ambiente que Erêndira via e sentia naquele momento.

‘’Pastos na beira dos tijolos estavam vasos de cactos e outras plantas de aridez. Pendurada entre dois pilares, agitando-se como a vela solta de uma balandra garrada, estava uma rede sem cor. Por cima do assobio da tormenta e as cordoadas da água ouviam-se gritos distantes, uivos de animais remotos, vozes de naufrágio.’’ (página 53).

Poucas vezes o narrador usa elementos do deserto para transpassar o clima físico desagradável e da miséria do espaço no qual se passa a história

 ‘’A avó protegia-se do sol eterno com um guarda-chuva descosido e respirava mal pela tortura do suor e do pó’’ (página 53).

 ‘’A avó observou com incredulidade as ruas miseráveis e solitárias de uma povoação um pouco maior, mas tão triste como a que tinham abandonado’’ (página 54).

 Tempo e recurso de subjetivação dos personagens 

O tempo cronológico no conto se dá de forma sequencial, sendo apresentado na ordem passado-presente em que ocorrem os acontecimentos. Entende-se que toda a trajetória de Erêndira tenha durado em torno de 6 anos até a morte de sua avó e posterior fuga. No tempo psicológico é possível perceber o impacto do tempo sobre a maturidade de Erêndira que, apesar da juventude, sentia-se mais velha e madura devido ao sofrimento e abuso que sofreu nas mãos da avó.

‘’Erêndira pôs então a bandeja numa mesa, inclinou-se sobre a avó, observou-a bem, sem lhe tocar, e, quando se convenceu de que estava morta, o seu rosto adquiriu subitamente toda a madureza de pessoa adulta que não lhe tinham dado os seus vinte anos de infortúnio.’’ (página 82).

 As analepses se encontram muito presentes no conto pelos delírios nostálgicos da avó durante o sono, onde acaba por revelar fatos de seu passado.

 ‘’ –Lá estava ele –dizia –, comum papagaio no ombro e um trabuco de matar canibais, como chegou Guatarral às Guianas, e eu senti o seu alento de morte quando se especou em frente de mim e me disse: <>’’ (página 78). 

2.Conteúdo 

Estilo de época em que se insere o texto
Gabriel Gárcia Marquez no conto de Erêndira retrata como estava a situação da América Latina em relação aos Estados Unidos da América, sendo este dominador sobre as nações de menor riqueza. Erêndira representando a liberdade e a avó que se negava a perdoar a dívida seria uma forma encontrada por Gabriel para representar a avareza dos Estados Unidos, com o ‘’sangue verde’’ da avó representando o dinheiro. O autor retratou como as nações se portavam em relação a grande potência, que de uma forma tentava efetivar uma dominação extrema desses países. A presença do mesmo no Iraque é outro fator que comprova essa tentativa, situação vista até os dias atuais.

Estilo do autor
Gabriel Gárcia Marquez nasceu na Colômbia e morreu dia 17 de abril de 2014, vítima de uma pneumonia. Conhecido por criar o realismo mágico na literatura latino americana. Essa escola literária foi conhecida no século XX, pois reúne a união do mundo mágico com o mundo real visto com grande intensidade nas obras de Gabriel. No conto Erêndira, Gárcia utilizou grande parte do realismo, aceitável a lógica e a razão, como a prostituição infantil. O autor dentro dessa obra traz críticas a diversos temas recorrentes na sociedade, rompendo assim paradigmas.

Recursos de linguagem 
Uso de metáforas

 ‘’ –Tenho vidro moído nos ossos –disse’’ (página 57).

 Nessa fala de Erêndira o autor faz uma metáfora para intensificar a dor da menina, chegando a colocar ‘’vidro moído’’ no lugar dos ossos para descrever a dor no corpo.

 ‘’A avó, nua e grande, parecia uma formosa baleia branca na alverca de mármore’’ (página 49).

 Nesse trecho o autor faz uma metáfora para descrever o corpo grande da avó de Erêndira.

‘’Enquanto o viúvo a despia, rasgando-lhe a roupa com unhadas esgaçadas, como a arrancar erva, desfazendo-a em longas tiras de cor que ondulavam como serpentinas e se iam com o vento’’ (página 53).

No trecho acima o autor faz uma metáfora com as roupas de Erêndira ‘’como arrancar erva’’, em seguida pode-se notar um leve realismo mágico, pois não seria possível Erêndira ver as tiras de suas roupas ‘’ondulando como serpentinas’’ em uma espécie de câmera lenta já que tudo estava acontecendo tão rápido naquele momento.

Comparação Emma Bovary (Madame Bovary) x Marguerite Gautier (A Dama das Camélias)





  Tratando-se de uma obra do Realismo e outra do Romantismo, pretendo neste texto comparar a personagem Emma Bovary e Marguerite Gautier. Em A Dama das Camélias, Marguerite apresenta-se como uma cortesã da qual levava uma vida desmedida em luxo e excessos. Ao conhecer Armand, apaixona-se verdadeiramente, afastando-se do antigo modo luxuoso e desregrado de viver para ir morar com Armand no campo. Porém, devido a circunstâncias sociais e a pedido do pai de Armand, Marguerite renuncia a seu amor em prol do bem amado, para que este não sofra a seu lado as consequências que esta relação traria, garantindo assim a oportunidade a Armand de não gerar conflitos familiares e sociais por envolver-se com uma cortesã. Desta forma, Marguerite purifica-se, tornando-se um ser honrado, como por exemplo, o herói clássico, pois coloca os próprios sentimentos em ordem a fim de agir corretamente, livrando-se dos pecados cometidos anteriormente como cortesã, pois amou verdadeiramente.  Além disso, há de se considerar esta renuncia ao amor algo a mais do que simples desejo do bem amado, mas sim um desejo oculto de tornar-se e ver-se uma cortesã ‘’honrada’’ e ‘’pura’’ perante a sociedade.

  Já em Madame Bovary, há espaço para duas interpretações da personagem, por um lado um comportamento inconformista em relação a sua classe social e por outro um comportamento ambicioso e conformista. Ao casar-se com Charles, Emma encontrava-se entusiasmada pelo marido médico e a posição social em que ascenderia, encontrando às emoções e experiências possíveis à classe burguesa. Porém, Emma se depara com uma vida monótona, distante do luxo e das paixões que imaginara ao ler seus livros enquanto vivia no campo. Inconformada, Emma comete adultério e consumismos, levando-a a depressão e por fim, a morte. Representando assim, um ideal de inconformismo, além de afirmar Emma como sujeita aos interesses sociais. Partindo do ponto de vista que Emma teria sido ambiciosa e conformista, ter-se casado com Charles, médico que, embora medíocre, era apaixonado pela esposa e as suas vontades buscava satisfazer, faz de Emma um ser egoísta e interesseiro, na qual o status de médico fizera nascerem seus sentimentos por Charles, além da oportunidade de sair do campo para frequentar locais e encontros burgueses. Na medida em que Emma se decepcionava e se entediava com a nova vida, buscou meio de saciar seus anseios, o que a levou a morte, justamente pela não realização destes.


  Portanto, Marguerite tratar-se-ia de um personagem sujeito as condições sociais, visto que seu amor por Armand não triunfa sobre essas condições, além de ser considerada um herói romântico por seus atos nobres ao final do enredo. Enquanto Emma tratar-se ia de um personagem ambicioso e egoísta que, ao mesmo tempo em que é idealizadora perante a condição social do marido, também demonstra ser inconformada com a condição social em que se encontrava anteriormente. Revelando dois aspectos possíveis a personagem, a de inconformada e/ou a de interesseira conformada. 

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Análise literária Hamlet- Shakespeare


Ação:
A aparição do fantasma armado do falecido rei Hamlet desencadeia em Horácio e príncipe Hamlet a premonição de que algo de mau agouro estava por vir, sendo confirmada esta suspeita logo após o diálogo entre o Fantasma e Hamlet. A descoberta da traição de Cláudio e o pedido do pai por vingança gera em Hamlet um desejo apressado de cumprir o prometido, assim ele passa a agir em prol desta causa, tornando todos os seus pensamentos e vontades direcionados a este fim. Suas intenções em mostrar-se louco ficam mais evidentes a cada ato que pratica, levando-o para mais perto do momento oportuno de se vingar. Após ter surgido no quarto de Ofélia transparecendo estar fora de si, Polônio decide comunicar ao rei o ocorrido, tramando ambos um encontro entre Ofélia e Hamlet para tirar a prova real da causa de sua loucura. Passado o encontro e a rejeição de Hamlet a Ofélia, o Rei decide que irá manda-lo para a Inglaterra, nisto chegam seus dois colegas de Wittenberg e uma trupe de atores. Hamlet frustrado com sua vingança não cumprida, arma junto aos atores uma peça semelhante ao ato traiçoeiro de Cláudio, para, dependendo da reação do rei, comprovar sua culpa e assim tomar uma atitude. Ao assistir a peça, o rei demonstra-se extremamente perturbado e toma consciência de que Hamlet pode lhe ser prejudicial.  Em seguida, Hamlet em uma discussão com Gertrudes, acaba por matar Polônio que estava escondido atrás da tapeçaria. Numa tentativa de livrar-se, Cláudio despacha Hamlet com urgência para a Inglaterra junto a uma carta pedindo que fosse executado assim que chegasse. Descobrindo a tramoia do tio, Hamlet escapa por navios piratas e retorna a Elsinor. 

Tempo:
Em Hamlet o conceito de tempo não está bem definido, pois os acontecimentos se passam de forma rápida e contínua, o que se mostra contrário ao levar em consideração o tempo necessário para a tomada das principais decisões dos personagens. Algumas descrições feitas quanto ao estado em que a Dinamarca se encontrava demonstram um período de guerra que ao desenrolar dos atos indica a passagem de, pelo menos, um ano.




Espaço:
O Espaço em que ocorre a maior parte da obra se passa na Dinamarca, nas redondezas e entranhas do Castelo, além das referências utilizadas para descrever a Noruega, Inglaterra, e até mesmo Roma, feita por Horácio quando liga os acontecimentos na Dinamarca como o mesmo mau presságio que se sucederam a queda de Júlio. O próprio ambiente contrasta com os sentimentos dos personagens, criando significado, por exemplo, na noite em que os guardas presentes na esplanada do castelo, se deparam com o fantasma. A descrição feita por eles, como um lugar de extremo frio, a meia noite, remetem ao medo e a ligação do sobrenatural.

‘’ BERNARDO: Acabou de soar a meia-noite. Vai pra tua cama, Francisco.
FRANCISCO: Muito obrigado por me render agora. Faz um frio mortal – até meu coração está gelado.’’ ( p. 3 Ato I, Cena I).

Muitas das descrições do ambiente observadas na obra demonstram o relacionamento entre a visão do personagem com a realidade, aquilo que é descrito levando em conta seus sentimentos e experiências.

‘’HAMLET: A Dinamarca é uma prisão!
ROSENCRANTZ: Então o mundo também.
HAMLET: Uma enorme prisão, cheia de células, solitárias e masmorras – a Dinamarca é das piores.’’ (p. 40 Ato II, Cena II).

Personagens:

Hamlet:
Filho do falecido rei Hamlet e de Gertrudes, sobrinho de Cláudio, apaixonado por Ofélia e personagem principal. Desde o inicio da tragédia, Hamlet transparece toda sua tristeza e luto pela morte do pai, além da rejeição pelo tio, tanto como por quem é, quanto por ter se casado com sua mãe logo após o funeral. Há um conflito interno no qual o personagem não deixa claro, apesar das atitudes hostis em relação ao tio, e as motivações de vingança regidas pelo amor ao seu pai, também há um sentimento de perda do poder a quem lhe era por direito, além da repulsa pela mãe por entregar-se a este relacionamento incestuoso tão apressadamente e de forma insensata, negligenciando-se em perpetuar o luto pelo rei Hamlet, morto recentemente. Os motivos de sua vingança seriam, portanto, não somente pela memória do pai, mas sim por motivos também pessoais. Esses conflitos são tanto de ordem politica quanto sentimentais.

‘’HAMLET: Pois é; não achas que é meu dever agora – Com esse que matou o meu rei e prostituiu minha mãe; Que se interpôs entre a eleição ao trono e as minhas esperanças; ’’ (p. 106 Ato V, Cena II).

 A criação de uma segunda personalidade em Hamlet para poder efetivar sua vingança demonstra toda sua inteligência e astúcia, mas também demonstra a linha tênue entre a lucidez e a insanidade, tanto é que ao longo da obra se torna difícil identificar os momentos em que Hamlet está fingindo, como por exemplo, quando conversa com si mesmo e revela seus pensamentos suicidas, questões existenciais que o afligem e até mesmo a própria definição de loucura, criticando o contexto da sociedade em que vivia e suas atitudes sem nexo, visível em sua fala:

‘’HAMLET: Não é tão estranho; meu tio agora é rei da Dinamarca, e muitos que faziam caretas pra ele enquanto meu pai era vivo, hoje dão vinte, quarenta, cinqüenta, até cem ducados por um retrato dele em miniatura. Pelo sangue de Deus! Há nisso alguma coisa sobre-natural que a filosofia não consegue explicar. ‘’ (p. 43 Ato II, Cena II).

Devido a esse pedido de vingança por forças maiores, sobrenaturais, Hamlet se sente prisioneiro dos próprios pensamentos, estes agora motivados somente por esta causa. A culpa pela não efetivação da sua vingança o deixa angustiado, até dado momento em que toma consciência de sua covardia, deixando de lado sua passividade. No fim da obra é notável como a morte, os feitos em vida e o fim a que resultam, despertam a curiosidade de Hamlet, mostrando seu caráter introspectivo. Pode ser considerado um personagem redondo por alterar seu comportamento ao longo da peça.

Cláudio:
Irmão do falecido rei Hamlet e assassino do mesmo, rei da Dinamarca. Homem de caráter maldoso, traiçoeiro, falso, uma sombra do irmão a quem possuía tantas virtudes, demonstra durante toda a peça desconfiança mutua para com Hamlet. Movido pela inveja e pelo desejo incestuoso por Gertrudes, utiliza de seu poder de sedução para conseguir o que quer. Apesar de demonstrar culpa pelo assassinato por medo ao julgamento do divino, deixa claro não sentir arrependimento pelo feito, pois fazia proveito dos bens que colheu. Trata-se de um personagem plano, pois desde o início apresenta o mesmo comportamento enganoso e perverso. Personagem Plano.

Polônio:
Conselheiro do rei, pai de Ofélia e Laertes, homem fiel a Deus e ao reino. Pelos conselhos dados na partida de seu filho Laertes a França, é possível identificar um caráter sábio em Polônio, de alguém experiente nos relacionamentos e acontecimentos da vida.
  
‘’ (Põe a mão na cabeça de Laertes.) E trata de guardar estes poucos preceitos: Não dá voz ao que pensares, nem transforma em ação um pensamento tolo. Amistoso, sim, jamais vulgar. Os amigos que tenhas, já postos à prova, Prende-os na tua alma com grampos de aço; Mas não caleja a mão festejando qualquer galinho implume Mal saído do ovo. Procura não entrar em nenhuma briga; Mas, entrando, encurrala o medo no inimigo, Presta ouvido a muitos, tua voz a poucos. Acolhe a opinião de todos – mas você decide. ‘’ (p. 18 Ato I, Cena III).

Polônio é um homem evidentemente preocupado com os filhos, porém infeliz foi seu destino sendo morto por Hamlet ao confundi-lo com o rei Cláudio. Personagem Plano.

Horácio:
 Amigo de Hamlet e acadêmico de Wittenberg, Horácio chega a Elsinor com o intuito de ver os ritos funerais do falecido rei Hamlet, mas acaba prolongando sua estadia pelo apressado casamento de Gertrudes e o rei Cláudio. Horácio se mostra um companheiro fiel, não revelando a verdadeira face de Hamlet por trás da loucura representada, além de auxiliar nos esquemas de vingança. Personagem plano.

Laertes:
Filho de Polônio, hábil esgrimista e irmão de Ofélia, viaja para a França no inicio da trama, retornando a Elsinor assim que recebe notícias da morte do pai. Tomado pela fúria, decide se vingar do assassino, fazendo com que se assemelhe ao espirito de vingança de Hamlet. Apesar de ter sido corrompido pela tramoia de Cláudio e pelo ódio cego, Laertes arrepende-se no desfecho da obra.  Personagem redondo.

Ofélia:
Filha de Polônio, irmã de Laertes. Moça jovem e pura, apaixonada por Hamlet, se vê deprimida ao compreender que o amor dos dois estava além da vontade de ambos, pois Hamlet tinha deveres para com o Estado. Proibida pelo pai de manter contato com o amado e instruída a fazer parte de uma encenação para descobrir a real causa da loucura de Hamlet, Ofélia recebe insultos e a negação de que seu amor era correspondido. Após a notícia da morte do pai, Ofélia enlouquece verdadeiramente, e acaba por suicidar-se num lago. Personagem redondo.

Fortinbrás:
Filho de Fortinbrás, antigo rei da Noruega e sobrinho do atual rei. Jovem determinado a recuperar as terras perdidas pelo pai num combate em que foi morto contra o falecido rei Hamlet da Dinamarca. Personagem plano.

Gertrudes:
Mãe do príncipe Hamlet, viúva do falecido rei Hamlet e esposa do atual rei da Dinamarca.

Diálogos:
Os diálogos, principalmente da parte de Hamlet, são riquíssimos em questões existenciais e filosóficas, mostrando a complexidade dos sentimentos humanos. Com o uso de monólogos, Hamlet consegue chegar ao fundo de sua consciência, expondo a dor profunda que sente pelo falecimento do pai e pela relação incestuosa da mãe com o tio.

‘’Morto há apenas dois meses! Não, nem tanto. Nem dois. Um rei tão excelente. Compará-lo com este É comparar Hipérion, Deus do sol, Com um sátiro lascivo. Tão terno com minha mãe Que não deixava que um vento mais rude lhe roçasse o rosto. Céu e terra! É preciso lembrar?’’. (p. 12 Ato I, Cena II).

Seus pensamentos suicidas entram em conflito com o sobrenatural, questionando-se a respeito da morte e o desconhecido que viria a seguir.

‘’HAMLET: Oh, que esta carne tão, tão maculada, derretesse, Explodisse e se evaporasse em neblina! Oh, se o Todo-Poderoso não tivesse gravado Um mandamento contra os que se suicidam.’’ (p. 12 Ato I, Cena II).

Outra característica notável é a de persuasão de Hamlet nos diálogos para convencer a todos de que está realmente louco, fora de si, mas deixando transparecer sua real astúcia por trás do disfarce.

‘’HAMLET: Calúnias, meu amigo. O cínico sem-vergonha diz aqui que os velhos têm barba grisalha e pele enrugada; que os olhos dele purgam goma de âmbar e resina de ameixa; que não possuem nem sombra de juízo; e que têm bunda mole! É claro, meu senhor, que embora tudo isso seja verdadeiro, e eu acredite piamente em tudo, não aprovo nem acho decente pôr isso no papel. Pois o senhor mesmo ficaria tão velho quanto eu se, como o caranguejo, se pusesse a avançar de trás pra frente.’’ (p. 39 Ato II, Cena II).

Hamlet vê seu destino sendo conduzido por forças sobrenaturais, levantando questionamentos sobre até que ponto suas vontades teriam poder para guiá-lo ao futuro desejado, concluindo assim que o homem é prisioneiro dos próprios pensamentos. Para ele, o mundo, o homem, toda a criação, não lhe interessam mais nem lhe trazem alegria. 
‘’HAMLET: Oh, Deus, eu poderia viver recluso numa casca de noz e me achar o rei do espaço infinito se não tivesse maus sonhos.’’ (p. 40 Ato II, Cena II).

Em relação aos diálogos de polônio para com o filho Laertes, há grandes ensinamentos, lições de moral, mostrando como era sábio nas questões relacionadas ao social e a vida. 

‘’(Põe a mão na cabeça de Laertes.) E trata de guardar estes poucos preceitos: Não dá voz ao que pensares, nem transforma em ação um pensamento tolo. Amistoso, sim, jamais vulgar. Os amigos que tenhas, já postos à prova, Prende-os na tua alma com grampos de aço; Mas não caleja a mão festejando qualquer galinho implume Mal saído do ovo. Procura não entrar em nenhuma briga; Mas, entrando, encurrala o medo no inimigo, Presta ouvido a muitos, tua voz a poucos. Acolhe a opinião de todos – mas você decide. Usa roupas tão caras quanto tua bolsa permitir, Mas nada de extravagâncias – ricas, mas não pomposas. O hábito revela o homem, E, na França, as pessoas de poder ou posição Se mostram distintas e generosas pelas roupas que vestem. Não empreste nem peça emprestado: Quem empresta perde o amigo e o dinheiro; Quem pede emprestado já perdeu o controle de sua economia. E, sobretudo, isto: sê fiel a ti mesmo. Jamais serás falso pra ninguém  Adeus. Que minha bênção faça estes conselhos frutificarem em ti.’’ (p.18 Ato I, Cena III).

Rubricas:
Na obra Hamlet, as rubricas estão presentes em vários momentos, determinando a vontade do autor a respeito da encenação do ator, o espaço em que a cena acontece, entonações, etc. No primeiro Ato, nas Cenas I e II, é perceptível as rubricas pela descrição do cenário onde encontram-se os guardas, as atitudes do Fantasma e em que estado se encontram os ambientes. 
‘’Elsinor – Terraço diante do castelo. (Francisco está de sentinela. Bernardo entra e vai até ele.)’’ (p. 3 Ato I, Cena I). 

‘’Mas calma agora! Olhem: ele está aí de novo! (O Fantasma entra.) Vou barrar o caminho, mesmo que me fulmine. (Ao Fantasma.) Pára, ilusão! (O Fantasma abre os braços.)’’ (p. 7 Ato I, Cena I).

‘’ (O galo canta.) Fala! Pára e fala! Cerca ele aí, Marcelo!’’ (p. 7 Ato I, Cena I).
‘’ (À Rainha.) Venha, senhora, O consentimento nobre e espontâneo de Hamlet Traz um sorriso a meu coração e, em louvor disso, O rei não erguerá hoje um único brinde Sem que o grande canhão o anuncie às nuvens, Pra que as nuvens, ecoando a saudação real, Reproduzam, no céu, a alegria terrestre. Venham todos. (Fanfarras. Saem todos, menos Hamlet.)’’ (p. 12 Ato I, Cena II).

Pode-se considerar também como rubrica a própria descrição de Hamlet à seus trajes e modos de agir.
‘’Não é apenas o meu manto negro, boa mãe, Minhas roupas usuais de luto fechado, Nem os profundos suspiros, a respiração ofegante. Não, nem o rio de lágrimas que desce de meus olhos, Ou a expressão abatida do meu rosto, Junto com todas as formas, vestígios e exibições de dor, Que podem demonstrar minha verdade.’’ (p. 11 Ato I, Cena II).
Ato II e III, gestos e referências de estado dos atores, descrição do ambiente.

‘’POLÔNIO: (Apontando pra cabeça e ombros.) Separe isto, disto, Se for de outra maneira; Se as circunstâncias me ajudarem, Eu acharei a verdade, Mesmo que esteja escondida no centro da terra.’’ (p. 38 Ato II, Cena II).

‘’POLÔNIO: Saiam, por favor, me deixem só com ele. Vou falar com ele agora. Oh, eu suplico. (Saem o Rei, a Rainha e o séquito. Entra Hamlet, livro na mão.)’’ (p. 38 Ato II, Cena II). 

‘’HAMLET: Eles chegam pro espetáculo. Devo fazer o louco. Escolhe um bom lugar. (Marcha dinamarquesa. Fanfarra. Entram o Rei, a Rainha, Polônio, Ofélia, Rosencrantz, Guildenstern e outros Cortesãos, com a guarda carregando tochas.)’’ (p. 57 Ato III, Cena II).

Apesar das rubricas estarem presentes em toda a obra Hamlet, um exemplo que se faz mais presente está na própria metalinguagem utilizada para descrever a cena em que o teatro ocorre dentro da própria peça.

‘’ HAMLET: Tanto assim? Então, se o diabo ainda se veste de negro, eu usarei luto de luxo. Céus! Morto há dois meses e ainda não foi esquecido? Então há esperança de que a memória de um grande homem possa sobreviver a ele até uns seis meses. Mas, por Nossa Senhora, terá que construir catedrais ou sofrerá a punição do esquecimento, como o cavalo-de-pau cujo epitáfio vai ser: “Ói! Ói! Esqueceram da égua!” (Soam oboés. Começa a pantomina. Entram um Rei e uma Rainha, muito amorosos; os dois se abraçam. Ela se ajoelha e faz demonstrações de devoção a ele. Ele se levanta do chão e inclina a cabeça no ombro dela. Ele se deita num canteiro de flores. Ela, vendo-o dormir, se afasta, sai. Imediatamente surge um homem, tira a coroa do rei, derrama o veneno no ouvido dele. Sai, beijando a coroa. A Rainha volta; encontra o Rei morto, faz apaixonadas demonstrações de dor. O Envenenador volta, acompanhado de dois ou três comparsas, e mostra-se condoído com a morte do Rei; acompanha a Rainha em suas demonstrações. O cadáver é levado embora. O Envenenador corteja a Rainha com presentes. Ela mostra alguma relutância; recusa os presentes por uns momentos, por fim aceita as provas de amor. Saem.)’’ (p. 58 Ato III, Cena II).
Ato IV e V
‘’RAINHA: Há um salgueiro que cresce inclinado no riacho Refletindo suas folhas de prata no espelho das águas; Ela foi até lá com estranhas grinaldas De botões-de-ouro, urtigas, margaridas, E compridas orquídeas encarnadas, Que nossas castas donzelas chamam dedos de defuntos, E a que os pastores, vulgares, dão nome mais grosseiro. Quando ela tentava subir nos galhos inclinados, Para aí pendurar as coroas de flores, Um ramo invejoso se quebrou; Ela e seus troféus floridos, ambos, Despencaram juntos no arroio soluçante.’’(p. 94-95 Ato IV, Cena VII).

‘’PRIMEIRO COVEIRO: (Canta.) Uma picareta e uma pá, uma pá E também uma mortalha Cova de argila cavada Pra enterrar a gentalha. (Desenterra outro crânio.)’’ (p. 98 Ato V, Cena I).

‘’(Marcha fúnebre. Saem, levando os corpos; depois do que se ouvem salvas de artilharia.)’’ (p. 116 Ato V, Cena II).

Conflito dramático:
No início da obra, o rei Hamlet já é tido como morto por uma picada de cobra enquanto dormia nos jardins reais, porém seu fantasma trajado em armadura passa a vagar pelas redondezas do castelo da Dinamarca durante a noite. Tendo presenciado essa aparição, Horácio decide contar ao amigo Hamlet o ocorrido, e ambos fariam guarda na noite que estava prestes a chegar, a fim de falar com o fantasma. Ele aparece e convida Hamlet a segui-lo, contando como ocorreu sua morte verdadeiramente, fruto da traição do próprio irmão Cláudio que, almejando seu reino e sua rainha Gertrudes, derramou pelos ouvidos do falecido rei, enquanto dormia, um liquido mortal. A pedido do fantasma do pai, Hamlet inicia seus planos para vingar-se, desencadeando uma série de acontecimentos envolvendo todos a seu redor.

Reconhecimento:
O primeiro reconhecimento se dá quando Hamlet e o Fantasma se encontram. Horácio recebe a notícia de que o espectro do falecido rei Hamlet anda a circular pelas esplanadas do castelo durante a meia noite. Notando o mau presságio que este acontecimento trazia, Horácio decide contar ao príncipe Hamlet o ocorrido, este que decide fazer guarda na noite que estava prestes a chegar para comprovar a visão do amigo. O fantasma enfim aparece, convidando Hamlet a se juntar a ele para terem uma conversa em particular, contando assim os acontecimentos que antecederam sua morte, esta atuada pelo próprio irmão que, de posse de um veneno, derramou sobre os ouvidos do rei a dormir em seu jardim, o liquido mortal. Tendo conhecido os motivos a que levaram o tio a agir de tal maneira, tais como a inveja e o desejo proibido por Gertrudes, Hamlet promete ao espectro do pai que o vingaria, transformando a si mesmo e sua vida a esse propósito.
Com a chegada dos atores a Elsinor, Hamlet sente-se passivo em relação à vingança prometida ao pai falecido, decidindo assim a tomar alguma atitude que provasse a real traição cometida pelo tio. Surge a ideia de junto aos atores, desenvolver uma peça chamada a ‘’Ratoeira’’, cujo objetivo era despertar o sentimento de culpa em Cláudio, fazendo-o por meio de expressões e atitudes tornar visível e convincente a Hamlet o atentado contra a vida do falecido rei. Essa peça tratava-se de uma encenação de como Cláudio teria concretizado sua traição, além de uma demonstração de como a rainha deveria agir, pela concepção de Hamlet, caso fosse confrontada com a ideia da morte do marido e a substituição do mesmo por outro homem. Como esperado, o rei revela tamanho espanto ao ver a cena de morte do rei e pede para que acendam as luzes, encerrando a peça e confirmando sua culpa. É neste momento que Cláudio e Hamlet se veem confrontados, pois, Cláudio agora está a par da consciência do sobrinho em relação ao seu ato traiçoeiro, e Hamlet tem sua confirmação, deixando-o preparado para vingar-se.

Desenlace:
Após Hamlet ser despachado para a Inglaterra a pedido de seu tio Cláudio que estava a temer sua loucura e seu conhecimento dos acontecidos, o mesmo descobre, movido a intuição, uma carta onde o rei pedia sua execução quando chegasse ao destino. Por meio de navios piratas, Hamlet consegue retornar a Elsinor, onde depara-se com Ofélia morta e seu irmão Laertes tomado pela fúria, convencido por Cláudio de que Hamlet deveria ser executado por suas mãos num combate, para assim Laertes vingar-se pela morte de Polônio. Caso Laertes falhasse, o próprio rei daria cabo de envenenar o sobrinho, acabando assim com seu temor de ser descoberto. Laertes havia envenenado seu próprio florete antes de iniciar-se o combate, tornando assim qualquer golpe mortal a Hamlet. Durante a luta, a rainha acaba por tomar do cálice de Hamlet, o qual havia sido envenenado pelo próprio rei. Num ato de violência, as espadas acabam sendo trocadas, e ambos são tocados pelo veneno. É no fim de sua vida que Gertrudes percebe o ninho de traições pelo qual foi submetida. Laertes, prestes a morrer, revela a culpa pelo esquema criado por Cláudio, fazendo com que Hamlet fira o rei com a mesma lâmina que iminentemente o mataria. Cumprida assim sua promessa de vingança, Hamlet morre deixando a cargo de Horácio que revele a verdadeira identidade de tais acontecimentos.



O que é literatura?



Os conceitos de literatura sofreram diversas modificações ao longo da história, pois variavam de acordo com o pensamento da sociedade em questão.
  A literatura vista como escrita imaginativa, no sentido de ficção, acaba por ser incompleta pelo fato de outros gêneros textuais atrelados mais à realidade serem também considerados literatura, como: cartas, autobiografias, tratados filosóficos, discursos, etc.
  Outra definição de literatura, esta regida pelos formalistas russos, diz que a literatura é o emprego da linguagem de forma peculiar. Uma deformação da linguagem comum. O crítico russo formalista Roman Jakobson define a literatura como ‘’Violência organizada contra a fala comum’’. Em suma, o formalismo foi à aplicação da linguística ao estudo da literatura, para eles, o conteúdo era uma simples ‘’motivação’’ para a forma. Tratar-se-ia de uma linguagem especial se comparada à linguagem comum usada coloquialmente. O problema nessa teoria seria o de como definir o que é linguagem comum.
  A literatura vista como uma escrita altamente valorizada também pecaria nesse sentido, pois com a variação dos valores o que fora considerado literatura poderia deixar de ser, e vice-versa, além de que não se pode considerar qualquer coisa como literatura.
  Portanto, a sua definição não é imutável, estável, objetiva e bem definida, pois varia de valores e conceitos de determinada época. 

As bases das promessas



-Já o sol trinta voltas perfeitas tinha dado Sobre o verde da terra e o mar salgado Trinta dúzias de luas usando luz alheia Tinham doze vezes trinta sido lua cheia Desde que o amor uniu você e eu Pelos laços sagrados do Himeneu. 

-O sol e a lua darão mil voltas assim Antes que o nosso amor um dia tenha fim. Mas que infeliz eu sou!, tens estado tão mal, Tão longe de tua alegria habitual, Que eu temo por ti. Mas não tema esse temor; As mulheres são assim, no medo e no amor, Nelas os dois vivem sempre irmanados E, ou não são nada, ou são extremados. O meu amor, tu sabes, não pode ser maior, E quando o amor é grande, o medo não é menor. Num amor tão enorme qualquer dúvida assusta Pequenos medos crescem; e o amor, à sua custa. 

-Eu devo te deixar e muito em breve Mas o fim da existência me é mais leve Sabendo você, quando eu tiver partido, Amada e honrada; e com outro marido Tão terno quanto... 

-Não, eu não aceito! Um outro amor não cabe no meu peito. É maldição ter novo companheiro; Só tem o segundo quem mata o primeiro. 

- A razão que leva a um outro casamento Não é amor, é razão vil – o rendimento. Será matar meu marido de outro jeito Deixar novo marido me beijar no leito. 

- Você crê no que diz, mas sejamos serenos, É comum falarmos mais e fazermos menos; A intenção é apenas escrava da memória, Violenta ao nascer, mas transitória; Enquanto fruto verde só nos dá trabalho, E assim que madura cai do galho. É muito natural que nunca nos lembremos De pagar a nós, o que nós nos devemos; O que a nós na paixão foi por nós prometido Terminada a paixão perde todo o sentido. O sangue quente da dor e da alegria Já trazem consigo a própria hemorragia; Onde a alegria mais canta e a dor mais deplora, Num instante a dor canta e a alegria chora. O mundo não é eterno e tudo tem um prazo Nossas vontades mudam nas viradas do acaso; Pois esta é uma questão ainda não resolvida: A vida faz o amor, ou este faz a vida? Se o poderoso cai, somem até favoritos; Se o pobre sobe surgem amigos irrestritos. E até aqui o amor segue a Fortuna, eu digo; A quem não precisa nunca falta um amigo. Mas quem, precisado, prova um falso amigo Descobre, oculto nele, um inimigo antigo. Voltando ao começo de tudo que converso – Desejos e fatos correm em sentido inverso. Por isso nossos planos nunca atingem a meta, O pensamento é nosso, não o que projeta. Assim, tu crês que não terás outro marido; Uma crença que morre quando eu tiver morrido. 

-A terra não me dê pão, nem luz o céu! Repouso e paz me fujam – eu só tenha fel! A fé e a esperança se transformem em desdita Eu só tenha de meu um catre de eremita! Cada revés que bater na face da alegria Destrua, ao passar, tudo o que eu mais queria! Que uma eterna angústia me cosa e me recosa Se, uma vez viúva, for outra vez esposa!  

-Um juramento solene. Dileta, me deixa agora. Meu espírito pesa; quero enganar com o sono O tédio desta hora. (Dorme.)  



-Que o sono embale a tua alma: Nunca haja amargura entre nós, Só calma.

Trecho/ Hamlet- Shakespeare

Um descomplica que complica

Crônica referente ao novo acordo ortográfico

  Unificar uma língua falada em oito países? Só pode ser brincadeira, não é? Esse ‘’combinado’’ pode até ter lógica, tentar unificar, padronizar a língua portuguesa e acabar com essas diferenças de grafia no Brasil, Timor-Leste, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Angola, Cabo verde, Portugal e Guiné-Bissau, mas na prática, a história é outra. Apesar de o idioma ser o mesmo, a língua portuguesa falada no Brasil e em Portugal, por exemplo, tem muitas diferenças. Fim de tarde, passando na padaria para fazer um lanche, caso eu pedisse a atendente um ‘’sandes’’ o estranhamento ali seria inevitável, pois o sanduiche conhecido comumente aqui no Brasil para Portugal é o bendito sandes. Se os vocabulários são distintos, a grafia não deveria seguir na mesma direção? É um descomplica que complica ainda mais, uma tentativa de união que pode acabar separando, tanto é que alguns países (leia-se Brasil) acabaram ficando em cima do muro, prometendo efetivar essas mudanças ortográficas somente se outro país também a fizesse. Apesar do efeito filme de terror que a nova ortografia vem causando nas pessoas, metade tapando os olhos e os ouvidos, a outra se escondendo por qualquer canto, agora é pra valer, a partir de janeiro de 2016 tornou-se obrigatório. Mas vejamos por um lado bom, a famosa e nem tão famosa trema some de vez, isso é, famosa porque todo mundo conhecia, nem tão famosa pois raramente era utilizada, lembrando que as palavras estrangeiras continuam usando a trema, fica ‘’de bonito’’. A palavra seqüestro  que o diga, teve sua trema realmente sequestrada, o que é uma pena, não houve resgate pois ninguém se lembrava dela. Aliás, você sabia que as letras K, W e Y não faziam parte do nosso alfabeto? Pois é, eu também não, mas pode ficar tranquilo que agora as três já estão incluidíssimas. De micro algumas palavras realmente não tem nada, muito pelo contrário, na questão dos hifens, se o segundo elemento iniciar com S ou R, duplica-se essas consoantes, agora a mini-saia virou minissaia. Em briga de casal ninguém mete a colher, e se forem um o focinho do outro, o melhor mesmo é meter o hífen! Em prefixos terminados por R, permanece o hífen caso a palavra seguinte seja iniciada por R também, por exemplo: super-resistente, hiper-realista. Quando o prefixo termina em vogal, e o segundo elemento começa com uma vogal diferente, é paixão na certa, sem aquele bate-boca o hífen não acha a menor graça e cai logo fora, e assim os dois se unem, por exemplo: autoestrada, autoestima, autoanálise. Na questão dos acentos, não se usa mais o acento que diferenciava as palavras homógrafas, pêlo de cachorro e pelo menos agora não se diferenciam mais gramaticalmente, é tudo ‘’pelo’’. O mesmo ocorre com a pêra, perde o acento. Pode até demorar para a população começar a por em prática a nova ortografia, mas uma coisa é certa, não há quem não lembre que agora ‘’Idéia’’ virou Ideia,  ou quem não se chateie com uma ‘’Jibóia’’, ‘’Geléia’’ sem acento agudo. Pena do hiato, não terá acentos circunflexos nos casos de OO e EE, como: enjoo, voo, leem. Após tantas alterações, o melhor mesmo é procurar se informar e por em prática tais mudanças.